domingo, 29 de agosto de 2010

A DESESTRUTURAÇÃO DO ESTADO DE DIREITO

O editorial de hoje do Estadão, Toca numa questão que é vital para o futuro — ou falta dele — do Brasil. Lembrem-se que o lulo-petismo criou a República das Corporações no Brasil. O que vai abaixo é uma advertência contra a grande marcha do atraso.

Propostas de mudança da Constituição em exame pela Câmara dos Deputados aumentam as prerrogativas de funcionários do Executivo e do Judiciário, dão-lhes o poder de decidir sobre seus próprios salários e sobre o orçamento dos órgãos a que pertencem, garantem-lhes vencimentos iguais aos de funcionários de nível salarial mais alto e, sobretudo, asseguram-lhes prerrogativas até aqui exclusivas dos membros dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público, num claro desvirtuamento de funções que desorganiza o Estado.

A Constituição estabelece que compete privativamente ao presidente da República o envio ao Congresso do plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias (LDO) e as propostas de orçamento anual da União. Ela assegura ao Poder Judiciário autonomia administrativa e financeira, que dá aos tribunais a prerrogativa de elaborar suas propostas orçamentárias, “dentro dos limites estipulados conjuntamente com os demais poderes” na LDO. Também o Ministério Público elabora seu orçamento, dentro dos limites estabelecidos pela LDO.

Algumas das propostas de emenda constitucional (PECs) em tramitação na Câmara asseguram autonomia funcional, administrativa e financeira a diversos órgãos públicos, o que os retira da esfera de controle direto dos Poderes a que estão vinculados, transformando-os numa espécie de novos poderes, com funcionários dotados de “superpoderes”, como mostrou reportagem de Denise Madueño publicada segunda-feira pelo Estado.

Os membros da Advocacia-Geral da União (AGU) são beneficiários de duas dessas PECs. Uma delas assegura aos advogados e defensores públicos salário equivalente a 90,25% dos vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, medida que, se aprovada, deverá se estender às demais categorias da advocacia pública. Outra PEC assegura autonomia funcional, administrativa e financeira à AGU, à Procuradoria-Geral Federal e às procuradorias das autarquias federais, além das Procuradorias dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios. Desse modo, os advogados públicos, de qualquer autarquia federal e de qualquer município brasileiro, não responderão mais funcional, administrativa e financeiramente aos dirigentes dos órgãos para os quais trabalham e aos demais poderes constituídos.

Outras PECs estendem a autonomia funcional administrativa e financeira às administrações tributárias da União, dos Estados e dos municípios e garantem a independência e autonomia funcional aos delegados de polícia, os quais passarão a gozar também de garantias como vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de salários, de que gozam os juízes. Os delegados são contemplados por outra PEC que lhes assegura vencimento igual ao dos promotores de Justiça.

Há ainda uma PEC que confere à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) a competência - hoje limitada ao presidente da República, aos membros do Congresso Nacional, ao Supremo Tribunal Federal, aos tribunais superiores, ao procurador-geral da República e aos cidadãos em condições específicas - de apresentar projetos de lei.

É notório o desejo dos autores das propostas de afagar política e financeiramente categorias funcionais importantes, algumas nem tão numerosas, mas todas de grande prestígio na administração pública e na sociedade. São claras também as consequências que essas PECs, se aprovadas, terão sobre as finanças públicas, pois, em certos casos, os benefícios se estenderão automaticamente para outras carreiras ou estimularão a apresentação de outros projetos assegurando essa extensão.

Mas o efeito mais danoso dessas propostas é institucional. Ao ampliar competências e prerrogativas de diferentes órgãos públicos, elas criam poderes paralelos que desestruturam o Estado brasileiro. Do ponto de vista financeiro, a autonomia proposta para órgãos como a advocacia pública e para os órgãos arrecadadores em todos os níveis de governo reduz o alcance e a eficiência das políticas fiscais dos governos, cuja qualidade, pelo menos na esfera federal, já é muito criticável. São muito poucos os ganhadores, mas, com a desorganização do Estado, todos os demais cidadãos perderão.

Quebra de sigilo é fruto de “banditismo”, diz Gilmar Mendes

Por Felipe Seligman, na Folha:

Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, 54, afirmou que a quebra de sigilo fiscal de pessoas vinculadas a tucanos é fruto de “banditismo político” e revela “paradigmas selvagens da política sindical”.

Em entrevista anteontem à Folha, ele disse que “o servidor público não pode usar button”, numa referência àqueles que usam o cargo em benefício de seus partidos.

Mendes criticou o aparelhamento político do serviço público brasileiro, ao dizer que se trata de “uma anomalia que se normalizou”. “Os funcionários públicos precisam entender que não estão a serviço de uma instituição partidária”, declara.

Segundo ele, o episódio do vazamento da Receita Federal é algo típico de “partidos clandestinos que utilizavam dessas práticas como um instrumento de defesa contra um regime ditatorial”.

No comando do STF (2008-2010), o ministro ficou conhecido por críticas que fez ao que chamou de Estado policial e “espetacularização das prisões” pela Polícia Federal, que, segundo ele, estava fora de controle.

Folha - Como o sr. avalia esse vazamento de informações sigilosas da Receita Federal?
Gilmar Mendes - É algo assustador e lamentável. Sobretudo quando ocorre em uma instituição profissionalizada e profissional como a Receita Federal.

O sr. vê alguma relação com o grande número de cargos em comissão?
Claro. O aparelhamento de instituições é algo grave e nocivo ao serviço público do país. Os funcionários públicos precisam entender que não estão a serviço de uma instituição partidária. Quando fazem isso, estão descumprindo o princípio democrático.

Esse aparelhamento é tratado como algo natural no Brasil?
O servidor não pode usar button e isso é algo que se transformou em cultura ao longo do tempo. É uma anomalia que se normalizou.

Mas não existe só na Receita. É algo que se generalizou?
Para atender a interesses partidários, os interesses democráticos são desrespeitados. Isso acontece em qualquer órgão [aparelhado]. É o funcionário da Receita que quebra sigilo fiscal. É o funcionário de um banco que quebra o sigilo bancário.

Como combater isso, já que, como o sr. mesmo diz, se normalizou?
É preciso punir gravemente essa cultura de dossiês no país. Os partidos que se utilizaram disso têm que pedir desculpa. Têm que fazer um mea culpa. Porque isso é típico de partido da clandestinidade e não pode ocorrer em um regime democrático.

O aparelhamento é uma característica genuinamente brasileira?
Em outros países democráticos é pequeno o número de funcionários com ligações partidárias porque existem poucos cargos em comissão.
Aqui costumamos ver funcionários públicos a serviço de siglas partidárias. É coisa de partido clandestino que atuava contra regimes autoritários. Mas é preciso entender que não vivemos mais sob tais condições. Vivemos em um regime democrático e isso é inadmissível.

O sr. atribui o vazamento na Receita apenas à cultura de clandestinidade partidária?
Não. A cultura do vale-tudo da política sindical também pode estar ligada a tudo o que vem acontecendo. Não se pode transpor ao mundo político institucional os paradigmas selvagens da política sindical. Também vejo isso como outra fase do patrimonialismo. Aqueles que estão no poder acham que podem fazer tudo por estarem lá.

COMENTO

Bem, já venho fazendo essas denúncias à muito tempo atrás, desde do início do primeiro governo Lula, só espero que agora as autoridades brasileiras façam alguma coisa, para mudar esse caótico e lastimável quadro de banditismo institucionalizado e corrupção edêmica que se instalou no país desde de 2002, no início do governo dos petralhas.

2 comentários:

Cardoso Lira disse...

Feitiço do tempo: A guerrilheira Dilma nem está eleita ainda, e Antonio Palocci e o "Zé que Dirceu" já voltam a 2003…
Ah, o mundo da suja política, do jornalismo e das salsichas é muito engraçado, como não disse Bismarck. Uma reportagem de Wilson Tosta e Vera Rosa no Estadão de hoje dá o que pensar. Título: “Dirceu tenta barrar avanço de Palocci”. É a manchete do jornal.

A 35 dias da eleição, os ex-ministros José Dirceu e Antonio Palocci disputam os rumos de eventual novo governo comandado pelo partido. Depois de emitir sinais contrários à possível indicação de Palocci para a Casa Civil, Dirceu luta agora para impedir que ele volte a ditar os caminhos da economia, a partir de 2011.

Os dois caudilhos e “generais” do presidente Luiz Inácio Molusco da Silva reeditam a queda de braço que travaram no primeiro mandato dos PETRALHAS para definir a fisionomia do CORRUPTO governo. Abatido pelo escândalo do mensalão do PT, no ano de 2005, e cassado pela Câmara, Dirceu vislumbra perda de influência se Palocci - ex-ministro da Fazenda - assumir a Casa Civil sob o comando da guerrilheira Dilma.

A preocupação não é à toa: cabe ao ministro da Casa Civil coordenar a equipe, o que lhe dá muito poder e pode torná-lo candidato natural ao Planalto. Foi o que ocorreu com a própria Dilma, puxada para o cargo após a queda de Dirceu. Nove meses depois, em março de 2006, Palocci também caiu, no rastro da quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa.

Cardoso Lira disse...

Nada se apaga na Internet
Por Sandra Takata

Especialistas políticos estão reticentes em relação à arrecadação pela internet de pessoas físicas para os candidatos, permitida durante estas eleições. Dizem que a falta de confiança na política brasileira não dará frutos para este novo sistema. Já na cabeça da população deve vir a ideia de que “laranjas” doarão e que tudo terminará em pizza. No entanto, inicia-se aqui um divisor de águas nos hábitos eleitorais dos brasileiros.

A construção de um maior engajamento político começa agora. Talvez plantado para as futuras gerações que já estão acostumadas em navegar na internet e se expor nas redes sociais, respondendo as perguntas mais cabeludas no Formspring, e mantendo a frase “minha vida é um livro aberto”; mais atual que nunca. Mas uma nova fase inicia-se agora. E um caminho sem volta.

A internet traz inúmeras mudanças e talvez uma moralização na política brasileira. Nos bastidores, marketeiros políticos começam a sentir que suas verbas de campanha estão reduzidas este ano. Isto porque muitas empresas, que antigamente não precisavam se identificar como doadoras, não querem agora aparecer e ter seu nome ligado a partido ou a candidatos, e configurar em sites com o da ONG Transparência Brasil (www.transparenciabrasil.org.br) empenhada em combater a corrupção em terreno verde-amarelo.

E é aí que está o X da questão. Os sites, as redes sociais são armas importantíssimas para fazer com que a honestidade e transparência se tornem uma obrigação no meio político. É esta transparência, ao qual os jovens estão tão acostumados na internet, que guiará as campanhas daqui pra frente.

Para os que optaram por fazer a arrecadação pelo site por meio de doações de pessoas físicas terão de obedecer regras muito rígidas do Tribunal Superior Eleitoral, pois se houver alguma irregularidade na hora da prestação destas contas, o candidato corre o risco de ter sua posse impugnada ou nem participar de futuras eleições.

Mas os que forem ousados em apostar nesta nova ferramenta, cumprindo claramente as suas propostas, terão armas poderosas de fidelização de eleitores. Afinal quem tira o dinheiro do bolso para apostar num político é porque acredita muito em seus projetos. Muda-se o relacionamento do candidato com o eleitor.

O doador se torna um cliente que comprou um produto e quer testá-lo. E se não aprovar, pode ter certeza de que ele não pensará duas vezes para criar blogs, postar em seu You Tube, Facebook ou Twitter que sua escolha não foi bem feita. Hoje jovens já bloqueiam candidatos que tentam fazer aproximações sem nenhum propósito nas redes sociais.

Portanto, políticos ainda podem driblar as pessoas que ainda não têm acesso à internet atualmente (infelizmente mais de 60% da população brasileira) e não conseguem obter tanta informação. Mas não por muito tempo, pois se dizem que o brasileiro não tem memória, isso não será mais o problema, pois na internet nada se apaga.