Por Waldemar da Mouta Campello Filho
Em 2003, as despesas com o pagamento do Pessoal Militar Federal equivaliam a 1,18% do PIB, enquanto que, em relação ao Pessoal Civil da União, correspondiam a 2,63% do PIB e , à Administração Direta, 1,32% do PIB.
Em 2011, os mesmos dispêndios com os Militares Federais eram de 0,94 % do PIB, com os Servidores Civis correspondiam a 2,70% do PIB e com a Administração Direta 1,38% do PIB.
Portanto, enquanto, no período 2003/2011, os encargos financeiros com o Pessoal Militar, em relação ao PIB, decresceram, fortemente, esses gastos com os Servidores Civis e, particularmente, com os integrantes da Administração Direta, aumentaram.
Por outro lado, no mesmo período, as despesas com custeio einvestimento, na função Defesa Nacional, aumentaram de 0,22% do PIB para 0,35% do PIB.
Esse quadro resultou na atual situação iníqua, sob o ponto de vista salarial, em que se encontra o militar federal, na qual a sua remuneração média mensal corresponde a 68% daquela da Administração Direta ( categoria mais mal remunerada em todo o serviço público federal), ao passo que, em 2004, equivalia a 110,00%.
Mas essa situação perversa é mais grave ainda do que esses números, à primeira vista, indicam.
Pois, a redução de 1,18% para 0,94% do PIB nas despesas de pagamento do Pessoal Militar permitiu (tomando-se como referência o ano de 2011) uma “economia” de cerca de 9,7 bilhões de reais, apenas nesse ano; o que possibilitou o “financiamento”, no período, do acréscimo dos dispêndios de custeio e investimento de 0,22% para 0,35% do PIB.
Ainda mais, se o percentual de 1,18% do PIB com o pagamento do pessoal militar, constatado em 2003, permanecesse com esse valor até 2011 , a remuneração média dos militares federais corresponderia , atualmente, a 90% daquela da Administração Direta .
Registre-se que não se está sugerindo um aumento na percentagem de 1,18% , como ocorreu com os Servidores Civis e a Administração Direta , mas apenas a sua permanência . Se esse último valor tivesse evoluído do mesmo modo como ocorreu com essas categorias, atualmente, a remuneração média dos militares equivaleria a 94,50% daquela da Administração Direta.
Ocorre que o Ministro da Defesa, em Audiência Pública, realizada no dia 09/05/2013, na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, referiu-se ao fato de que, “nos últimos anos” (mais especificamente desde 2004) o orçamento da defesa “tem oscilado em volta de 1,5% do PIB”.
Ainda mais, disse o Ministro: ”E tem havido um incremento constante das dotações orçamentárias, às vezes há uma pequena oscilação de um ano para o outro. Mas se nós compararmos, por exemplo, de 2005 a 2013, a parte que mais interessa, porque é a mais sujeita a oscilações, a parte de Custeio e Investimento, passou pouco mais de R$ 6 bilhões em 2005 e chegou a R$ 17,5 bilhões em 2013.
Então, há uma considerável melhora na situação que está muito longe de corrigir ou sanar todas as falhas que existem, mas há um esforço constante nesse plano” (Ata da Reunião – Secretaria - Geral do Senado).
O Ministro da Defesa foi preciso no seu relato, no que se refere aos números apresentados.
Infelizmente, não esclareceu a parte que mais interessa na questão: Qual a fonte desses recursos que estão permitindo o incremento continuado (de 0,22 % do PIB, em 2003, para a 0,35% do PIB, em 2011) dos dispêndios com Custeio e Investimento na função Defesa Nacional?
Certamente, não residiu (e não reside) no aumento da percentagem, em relação ao PIB, dos gastos totais com a função Defesa Nacional, que, como disse o Ministro, nesses últimos anos, tem permanecido em volta de 1,5% do PIB.
Logicamente, só pode estar no apontado decréscimo (de 1,18% para 0,94%) das despesas com pessoal.
No entanto, esse esclarecimento não pode se restringir, apenas, à apreciação dos números constatados, mas, por uma questão de transparência, tem, também, de abranger o significado do fenômeno, em relação ao qual os números são apenas indicadores.
O que esses números estão a dizer?
Que o incremento das aquisições de materiais, armamentos, equipamentos, veículos, a realização de novos projetos, a sustentação de novos serviços estão sendo financiados com os recursos “economizados” em conseqüência do “arrocho salarial” infligido aos militares federais nesses últimos anos.
Os recursos advindos da redução de 1,18% para 0,94% do PIB, com pagamento de pessoal militar, têm permitido, dentro do teto de 1,5%, aumentar a verba de custeio e investimento de 0,22% para 0,35% do PIB.
Essa política imposta aos militares federais está na contramão da política remuneratória aplicada a todos os servidores públicos federais, desde 2004.
A submissão dos militares a essa condição iníqua é o fundamento de uma enganosa e maldosa modernização das Forças.
Maldosa porque o incremento da aquisição de materiais e equipamentos está se realizando com um grande sacrifício da Família Militar, que vive um momento angustiante, no qual, por exemplo, 70% dos Terceiros Sargentos da Força Terrestre, na ativa, percebem uma remuneração líquida de, aproximadamente, R$2.000,00.
Os militares federais estão na situação salarial degradante em que se encontram porque os recursos financeiros, que deveriam ser aplicados na correção de suas remunerações- como ocorreu em todas as categorias do Servidor Público Federal - estão sendo utilizados, no limite do teto de 1,50% do PIB , para compra de materiais e equipamentos.
Enganosa e maldosa porque decorre da manipulação de dados, perspectivas e intenções, que faz crer, ao desavisado, a realização de um esforço (“... há um esforço constante nesse plano”, como disse o Ministro), dos setores responsáveis, no sentido de corrigir as carências materiais das Forças , quando , na verdade, o que ocorre é a imposição do sacrifício à Família Militar para se obter os recursos necessários à aquisição de bens e serviços . É a aplicação de um critério moralmente inaceitável: considerar o homem - o fundamento de qualquer organização - como um meio e não como um fim.
Os soldados brasileiros estão sustentando, involuntariamente, com suas privações e renúncias, uma enganosa recuperação das Forças Armadas (porque não prioriza o seu principal elemento: o homem), que se acham sucateadas em virtude da incapacidade dos agentes administrativos responsáveis.
Waldemar da Mouta Campello Filho, Capitão-de-Mar-e-Guerra, é Presidente da CONFAMIL e Coordenador do Sistema CONFAMIL.