Por Merval Pereira
A CPI do Cachoeira nasceu de uma estratégia equivocada do ex-presidente
Lula e de José Dirceu na tentativa de, se não impedir, pelo menos
tumultuar o julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal. Já que
o adiamento para as calendas gregas não foi conseguido com o assédio
pessoal de Lula a ministros, dos quais o mais vistosamente frustrado foi
ao ministro Gilmar Mendes, que denunciou a tentativa de chantageá-lo,
partiram os petistas para montar uma CPI que colocaria a oposição contra
a parede.
Os objetivos principais eram os oposicionistas de maneira geral, o
governador de Goiás Marconi Perillo em particular, o Procurador-Geral da
República pelo atrevimento das acusações contra o PT, e a imprensa
livre representada pela revista Veja.
O rolo compressor governista, no entanto, não foi suficiente para fazer
da CPI uma cortina de fumaça para o julgamento do mensalão, e políticos
independentes impediram que a estratégia petista desse certo. Ao
contrário, o feitiço voltou-se contra o feiticeiro, e o surgimento da
empreiteira Delta com seus vínculos com o bicheiro Carlinhos Cachoeira
colocou o governismo numa sinuca de bico.
Frustradas todas as investidas contra seus inimigos, viram-se os
petistas na perspectiva de ser a CPI usada contra seus parceiros caso a
investigação sobre o empreiteiro Fernando Cavendish fosse adiante. A CPI
virou palco de uma batalha, fora do controle, até que oposição e
situação viram que era melhor exterminá-la sem dar tempo para novos
embates.
O Globo fez um levantamento nos 533 requerimentos que não serão votados e
constatou uma “troca de chumbo” entre governistas e oposicionistas que
poderia atingir a todos. A oposição propôs uma prorrogação da CPI por
seis meses, mas a situação aprovou apenas até o fim do ano, mesmo assim
sem nenhuma nova investigação.
Para o deputado Miro Teixeira, um dos líderes da ala independente, os
dois lados queriam mesmo esse desfecho, só que alguns posam para a
plateia defendendo maiores investigações, mas internamente trabalham
pelo fim da CPI. Seria a “bancada do cancã”, que distrai o público com
suas danças, na mordaz definição do parlamentar do Rio.
Tem razão Miro Teixeira quando diz que de nada valeria dar sobrevida à
CPI se não fosse para quebrar os sigilos de empresas fantasmas do
esquema de Cachoeira que receberam dinheiro da construtora Delta. Mas
essa quebra não interessava aos governistas de diversos matizes.
Uma peculiaridade da trama criminosa do bicheiro Cachoeira é que ela é
pluripartidária, perfeitamente adaptada aos tempos pragmáticos de
coalizões amplíssimas e sem nenhum nexo programático entre tais partidos
abrigados pelo generoso guarda-chuva governista.
Cachoeira ia além, e unia governistas e oposicionistas, sem distinção. O
ex-senador Demóstenes Torres, expulso do DEM, e o governador Marconi
Perillo, do PSDB de Goiás, que deve ser indiciado pelo CPI, são exemplos
goianos desse multipartidarismo. Assim como o governador do Distrito
Federal, Agnelo Queiroz, representa o petismo e se não for também
indiciado será devido à maioria esmagadora do governo na CPI.
O fato é que a construtora Delta tinha ramificações em todos os estados e
por todos os partidos, sendo a mais notória ligação com o governador do
Rio Sérgio Cabral, do PMDB, que teve todo o apoio do governo federal
para impedir que o sigilo da construtora fosse quebrado. A CPI do
Cachoeira vai se encerrar sem nenhuma contribuição a dar, e enviará os
dados que recebeu sob sigilo ao Ministério Público, que investiga o
esquema. Mesmo assim por que parlamentares independentes procuraram por
conta própria o Ministério Público em Goiás para combinar a remessa
desse material, para que não se perdesse.
Mais um fiasco a confirmar que o Congresso precisa se reciclar para não
continuar com a imagem negativa que tem diante da opinião pública.
Merval Pereira é Jornalista a membro
da Academia Brasileira de Letras. Originalmente publicado em O Globo em 3
de novembro de 2012.
PSDB e PPS pediram nesta terça-feira (6) à PGR (Procuradoria Geral da
República) a abertura de inquérito para investigar se o ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva teve participação no esquema do mensalão. Os
dois partidos afirmam, na representação protocolada nesta terça-feira
(6) na PGR, que as recentes revelações do publicitário Marcos Valério,
apontado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) como operador do mensalão,
justificam a abertura de uma nova ação penal que tenha Lula como foco.
"À época dos fatos, existia uma íntima ligação política e pessoal entre o
representado e o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, entendido como
o chefe da quadrilha pelo STF. Nesta perspectiva, indaga-se: a teoria
do domínio do fato, que foi utilizada para a condenação de José Dirceu,
não poderia ser aplicada - e com muito mais razão - ao chefe do próprio
José Dirceu?", questiona a oposição.
Na representação, os dois partidos citam reportagens da revista Veja em
que Valério teria afirmado que Lula seria o chefe do esquema criminoso e
que o publicitário teria pago propina, a pedido do PT, para silenciar
pessoas ligadas ao assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel,
em 2002.
PSDB e PPS também citam memorial encaminhado pelo advogado de Valério ao
STF, Marcelo Leonardo, em que afirma que o "mero operador do
intermediário seja a pessoa púnica de forma mais severa nesta ação
penal, ao lado do tratamento brando que se pretende dar aos verdadeiros
chefes políticos e interessados diretos no esquema".
Segundo a oposição, a própria defesa de Valério "traz elementos que
colocam em dúvida a frase que reiteradamente foi repetida pelo
ex-presidente, no sentido de que ele não sabia de nada".Na
representação, PSDB e PPS pedem que o procurador inste a revista Veja a
apresentar os indícios do envolvimento de Lula, citados nas matérias
publicadas.
Os dois partidos afirmam que estavam dispostos a formular a
representação desde o mês de agosto, mas decidiram esperar o fim do
julgamento para não "tumultuar" a análise da ação penal pelo Supremo.
"Agora que a fase de reconhecimento da culpabilidade se encerrou,
restando apenas a fixação das penas, nada mais impede que os fatos sejam
rigorosamente apurados", afirmam os partidos.
O DEM, que também assinaria originalmente o pedido de investigações,
manteve a decisão de não apoiar a representação. O partido acha mais
"prudente" aguardar a manifestação do Ministério Público sobre o
depoimento de Valério, uma vez que o publicitário prestou depoimento ao
procurador.
A representação é assinada pelo presidente do PPS, Roberto Freire (SP), o
líder do partido na Câmara, Rubens Bueno (PR), além dos senadores
Álvaro Dias (PSDB-PR), Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) e o deputado
Mendes Thame (PSDB-SP).
Dias decidiu assinar o pedido por considerar que é "dever" da sigla
pedir a investigação - uma vez que o publicitário Marcos Valério fez
novas revelações do esquema em depoimento sigiloso prestado à
procuradoria. Depois de submeter sua decisão à bancada do PSDB no
Senado, teve o apoio de outros colegas do partido.
Apesar da decisão, Dias não consultou formalmente o comando do PSDB para aderir à representação. A Folha
apurou que, como o presidente do PSDB, Sérgio Guerra, está em
tratamento médico, o líder decidiu assinar a representação sem uma
decisão formal da sigla. (Folha Poder)
Postado pelo Lobo do Mar