Uma triste passagem de bastão marcou a política brasileira na semana
passada: saiu de cena um escândalo político; entrou outro. De um lado, o
Supremo Tribunal Federal fez história ao definir as penas dos
condenados do mensalão. Treze dos réus, incluindo o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu,
vão para a cadeia em tempo integral – uma rara ocasião na história
brasileira em que poderosos pagarão por seus crimes. De outro lado, uma
nova personagem irrompeu na cena política nacional: Rosemary Nóvoa de Noronha, ou Rose. Falando em nome de um padrinho político poderoso, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
Rose trabalhou pela nomeação de vários afilhados no governo federal.
Ao
se dirigir a diretores de empresas estatais ou órgãos do governo, Rose
frequentemente se apresentava como “namorada” do ex-presidente. Um dos
afilhados de Rose, Paulo Vieira, foi preso pela Polícia Federal (PF) na Operação Porto Seguro,
acusado de chefiar uma quadrilha que cobrava propinas de empresários,
em troca de pareceres jurídicos favoráveis em Brasília – fosse no
governo, nas agências reguladoras ou no Tribunal de Contas da União.
Rubens Vieira, diretor da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac),
irmão de Paulo e outro dos afilhados de Rose, também foi preso. Tão logo
o caso veio a público, na sexta-feira dia 23 de novembro, Rose foi
exonerada do cargo que exercia, como chefe do gabinete da Presidência em
São Paulo.
Como foi possível que Rose, uma simples secretária do PT, acumulasse
tanto poder e prestígio, a ponto de influenciar nos rumos do governo
federal – e causar tamanho salseiro? “A investigação demonstra que o
poder de Rose advinha da relação dela com Lula. Não há elementos,
entretanto, de que o ex-presidente soubesse disso ou tivesse se
beneficiado diretamente do esquema”, afirma uma das principais
autoridades que cuidaram do caso. “Lula cometeu o erro de deixar que
essa secretária se valesse da íntima relação de ambos”, afirma um amigo
do casal Lula e Dona Marisa. “Deveria ter cortado esse caso há muito
tempo.”
Os autos do processo, de que ÉPOCA obteve uma cópia integral, e
entrevistas com os principais envolvidos revelam que:
1) Lula, ainda presidente da República, prestou – mesmo que não
soubesse disso – três favores à quadrilha. Por influência de Rose,
indicou os irmãos Paulo Vieira e Rubens Vieira para a direção,
respectivamente, da ANA e da Anac. Lula, chamado em e-mails de “chefão”
ou “PR” por Rose, também deu um emprego no governo para a filha dela, Mirelle;
2) A quadrilha espalhou-se pelo coração do poder – e passou a fazer
negócios. Os irmãos Vieira, aliados a altos advogados do PT que ocupavam
cargos no governo, passaram a vender facilidades a empresários que
dependiam de canetadas de Brasília;
3) Rose, gabando-se de sua relação com Lula, tinha influência no Banco do Brasil. Trabalhou pela escolha do atual presidente do BB, Aldemir Bendine,
indicou diretores (um deles a pedido de Delúbio Soares, o ex-tesoureiro
do PT condenado no caso do mensalão), intermediou encontros de
empresários com dirigentes do BB e obteve um contrato para a empresa de
construção de seu marido;
4) Despesas do procurador federal Mauro Hauschild, do PT, ex-chefe de
gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli e, depois,
presidente do INSS, foram pagas pela quadrilha. É uma situação similar à
do recém-demitido número dois da Advocacia-Geral da União (AGU), José
Weber Holanda – que, segundo a PF, recebeu propina;
5) A PF, mesmo diante das evidências de que Rose era uma das líderes da
quadrilha, optou por não investigá-la. Não pediu o monitoramento das
comunicações de Rose e não quis detonar a Operação Porto Seguro no
começo de setembro, quando a Justiça autorizara as batidas e prisões.
Esperou até o fim das eleições municipais.
De acordo com o relato feito a ÉPOCA por um alto executivo que
trabalhou na Companhia das Docas do Porto de Santos (Codesp), Rose
evocava sua relação com Lula para fazer indicações e interferir, segundo
seus interesses, nos negócios da empresa. Nessas ocasiões, diz o
executivo, Rose se apresentava como “namorada do Lula”. “Ela jogava com
essa informação, jogava com a fama”, diz ele. Lula fez três favores à
quadrilha dos pareceres enquanto era presidente da República
Uma história contada por ele ilustra o estilo de atuação de Rose. Em
2005, uma funcionária da Guarda Portuária passou a dizer na Codesp que
fora indicada para o cargo porque era amiga da “namorada do Lula”. O
caso chegou ao conhecimento da direção do Porto de Santos. Um diretor
repreendeu a funcionária e chegou a abrir uma sindicância para apurar o
fato – e ela foi demitida. O executivo conta que, contrariada, Rose
ligou para executivos para cobrar explicações e reafirmou o que a amiga
havia dito: “Eu sou a namorada do Lula”.
Os executivos acharam que ela
blefava. “No começo, a gente não sabia que ela era tão forte”, diz um
deles. No Porto, ela foi responsável pelas indicações de Paulo Vieira e
do petista Danilo de Camargo, ligado ao grupo do ex-ministro José Dirceu
no PT. Os dois passaram a atuar em parceria com Valdemar Costa Neto, o
deputado pelo PR condenado à prisão por corrupção passiva e lavagem de
dinheiro no caso do mensalão, responsável por indicar o presidente da
Codesp.
Um dos interesses desse grupo era perdoar uma parcela da dívida da
empresa transportadora Libra com a Codesp. O valor da dívida era de R$
120 milhões. O acordo foi fechado no Ministério dos Transportes, então
controlado pelo grupo ligado a Costa Neto, e contou com o aval de
Camargo, presidente do Conselho de Administração. O PT de Santos,
liderado pela ex-prefeita Telma de Souza, ficou revoltado com os termos
do acordo e resolveu cobrar explicações de Camargo. Novamente Rose
entrou em ação para defender os interesses da Libra, do PR de Costa Neto
e de Paulo Vieira. Na ocasião, diz o alto executivo, ela evocou
novamente o nome de Lula. Nos telefonemas que dava aos petistas
contrários ao perdão da dívida, afirma ele, Rosemary sempre mencionava o
então presidente.
Rose tem 57 anos, começou jovem na militância política e sua turma,
dentro do PT, é uma turma das antigas. Seus principais interlocutores no
partido, além de Lula, são Paulo Frateschi, secretário de organização
do PT, e os já mencionados Camargo e Dirceu. Rose trabalhou como
assessora de Dirceu nos anos 1990. Acompanhou de perto sua ascensão à
presidência do PT. No total, foram 12 anos de parceria. Foi no período
em que trabalhava com Dirceu que Rose conheceu Lula. Em fevereiro de
2003, com Lula no Planalto, Rose se tornou assessora especial do
gabinete regional da Presidência em São Paulo.
Em 2005, tornou-se chefe
da unidade. Seu poder no partido foi crescendo. Ela fazia triagem
informal dos currículos de candidatos a cargos do segundo escalão. Nessa
época, começou a exercer influência também no Banco do Brasil. Rose
trabalhou, de acordo com políticos e executivos do setor bancário, pela
indicação de Aldemir Bendine para a presidência do BB.
A proximidade com Bendine permitiu que Rose, em 2009, conseguisse um emprego para José Cláudio Noronha, seu ex-marido. Noronha ganhou a vaga de suplente no Conselho de Administração da Aliança Brasil Seguros, atual Brasilprev.
De acordo com as investigações da PF, Paulo Vieira forjou um diploma de
curso superior para que Noronha cumprisse uma exigência da Brasilprev e
assumisse a vaga. Em agosto do ano passado, o mandato de Noronha foi
renovado.
Rose era também próxima de Delúbio Soares,
o ex-tesoureiro do PT condenado a oito anos e 11 meses de prisão no
caso do mensalão. Os dois costumavam tomar café no Conjunto Nacional,
centro comercial próximo ao prédio do gabinete da Presidência. A pedido
de Delúbio, segundo executivos do BB, ela usou sua proximidade com
Bendine para conseguir a nomeação de Édson Bündchen para a
superintendência do BB em Goiás, em setembro passado.
Rose circulava tão bem no BB que pairava acima das disputas fratricidas
entre seus diretores. Era próxima também de Ricardo Flores,
ex-vice-presidente de crédito e ex-presidente da Previ, o bilionário
fundo de pensão dos funcionários do banco. Flores e Bendine travaram
embates corporativos constantes e são considerados inimigos. Isso nunca
impediu Rose de se sentir segura para pedir favores a ambos. Em 25 de
março de 2009, Rose pediu a Flores que examinasse um pedido de
empréstimo de cerca de R$ 48 milhões da empresa Formitex. Era um desejo
de Paulo Vieira – na época, ele ainda não era diretor da ANA.
“Gostaria
que encaminhasse esses dados técnicos ao Dr. Ricardo (Flores)
e, se possível, conseguisse uma agenda para o Dr. César Floriano”, diz
Paulo em e-mail para Rose que consta do inquérito policial. Floriano era
um dos empresários que bancavam a quadrilha. Em 17 de agosto de 2009,
Rose encaminha outro e-mail a Paulo em que pergunta se “aquele assunto
do Flores foi resolvido”. Poucos minutos depois, Paulo responde: “As
coisas com o Flores estão caminhando bem, ele tem sido muito legal e
parece que vamos avançar bastante” (leia o e-mail abaixo).
De acordo com a investigação da PF, além do emprego para o ex-marido,
Rose usou seus contatos no BB para ajudar o atual, João Vasconcelos.
Documentos apreendidos pela polícia na casa de Rose, em São Paulo,
mostram que a construtora de Vasconcelos, a New Talent, obteve um
contrato de R$ 1,1 milhão – sem licitação – com a Cobra Tecnologia,
subsidiária do BB. Tratava-se de uma obra de adequação e reforma do novo
centro de impressão da empresa em São Paulo.
Mais uma vez, Rose
recorreu a Paulo Vieira para forjar documentos. A Associação Educacional
e Cultural Nossa Senhora Aparecida, mantenedora da faculdade de
propriedade de Vieira em Cruzeiro, São Paulo, emitiu um falso atestado
de capacidade técnica para a New Talent conseguir o contrato com a
Cobra. Em maio de 2010, funcionários da Cobra encaminharam a Vasconcelos
o contrato com a New Talent.
Reportagem de Capa da Revistá Época. Clique nas imagens para ampliar e ler.
Rose e Lula tinham relação de intimidade, segundo a Folha.
A influência exercida pela ex-chefe do escritório da Presidência da
República em São Paulo, Rosemary Noronha, no governo federal, revelada
em e-mails interceptados pela operação Porto Seguro, decorre da longa
relação de intimidade que ela manteve com o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Rose e Lula conheceram-se em 1993. Egressa do sindicato dos bancários, ela se aproximou do petista como uma simples fã.
O relacionamento dos dois começou ali, a um ano da corrida presidencial de 1994. À
época, ela foi incorporada à equipe da campanha ao lado de Clara Ant,
hoje auxiliar pessoal do ex-presidente. Ficaria ali até se tornar
secretária de José Dirceu, no próprio partido. Marisa Letícia, a mulher
do ex-presidente, jamais escondeu que não gostava da assessora do
marido.
Em 2002, Lula se tornou presidente. Em 2003, Rose foi lotada no braço do
Palácio do Planalto em São Paulo, como "assessora especial" do
escritório regional da Presidência na capital. Em 2006, por decisão do próprio Lula, foi promovida a chefe do gabinete e
passou a ocupar a sala que, na semana retrasada, foi alvo de operação
de busca e apreensão da Polícia Federal. Nesse papel de direção, Rose contava com três assessores e motorista.
Sua tarefa era oficialmente "prestar, no âmbito de sua atuação, apoio
administrativo e operacional ao presidente da República, ministros de
Estado, secretários Especiais e membros do gabinete pessoal do
presidente da República na cidade de São Paulo". Durante 19 anos, o
relacionamento de Lula e Rose se manteve oculto do público. Em Brasília,
a agenda presidencial tornou a relação mais complicada. Quando a então
primeira-dama Marisa Letícia não acompanhava o marido nas
viagens internacionais, Rose integrava a comitiva oficial.
Segundo levantamento da Folha tendo como base o "Diário Oficial", Marisa
não participou de nenhuma das viagens oficiais do ex-presidente das
quais Rosemary participou. Integrantes do corpo diplomático ouvidos pela reportagem, na condição de
anonimato, afirmam que a presença dela sempre causou mal-estar dentro
do Itamaraty. Na opinião deles, a ex-chefe do escritório da Presidência
em São Paulo não era necessária.
Oficiais da Aeronáutica se preocupavam com o fato de que ela por vezes
viajava no avião presidencial sem estar na lista oficial. Em muitas
vezes, Rose seguia em voos da equipe que desembarca antes do presidente
da República para preparar sua chegada. Nessas viagens, seguranças que guardavam a porta da suíte presidencial
nas missões fora do Brasil registravam ao superior imediato a presença
da assessora. Oficiais do cerimonial elaboravam roteiro e mapa dos
aposentos de modo a permitir que o presidente não fosse incomodado.
Durante esses quase 20 anos, Rose casou-se duas vezes. Seu primeiro
marido, José Cláudio Noronha, trabalhou na Casa Civil do então ministro
José Dirceu quando Rosemary assumiu o escritório de São Paulo.Na chefia
do gabinete, ela construiu a fama de pessoa de temperamento
difícil. Lula chegou a receber de amigos reclamações dando conta de que
ela tratava mal os funcionários. Um deles descreveu um episódio em que
ela teria pedido para serventes
limparem "20 vezes" o chão do escritório até que ficasse realmente
limpo.
Apesar do temperamento, Rose era discreta e não gostava de contato com a
imprensa. Em algumas festas e cerimônias, controlava a porta de salas
vips, decidindo quem podia ou não entrar. Também costumava se consultar
com o médico de Lula e da presidente Dilma Rousseff, Roberto Kalil. Rose
acompanhou o ex-presidente em algumas internações durante o período
em que este se recuperava do tratamento de um câncer no Sírio-Libanês,
em São Paulo. Mas só pisava no hospital quando Marisa Letícia não estava
por perto.
Na campanha presidencial de 2006, a chefe de gabinete circulou nos
debates televisivos que Lula teve com o tucano Geraldo Alckmin. Ministros e amigos do ex-presidente não negam o relacionamento de ambos.
Foi de Lula a decisão de manter Rosemary em São Paulo, conforme relatos
de pessoas próximas. Procurado pela Folha, o porta-voz do Instituto Lula, José
Chrispiniano, afirmou que o ex-presidente Lula não faria comentários
sobre assuntos particulares.(Folha de São Paulo)
Postado pelo Lobo do Mar
2 comentários:
Rose do Lula: quadrilha pagou R$ 6 milhões em propinas.
As conversas telefônicas e os e-mails interceptados pela Polícia Federal na Operação Porto Seguro mostram que Paulo Vieira, preso há uma semana sob suspeita de tráfico de influência no governo federal, deu ordens para que integrantes do grupo fizessem pagamentos de R$ 6,2 milhões a outras pessoas e instituições durante três anos de investigação. Entre as ordens está a que foi dada para depósitos de R$ 10 mil a Mauro Henrique Costa Sousa, funcionário da SPU (Secretaria de Patrimônio da União). Segundo a PF, o dinheiro seria para "corromper" Sousa na obtenção de um parecer do órgão favorável aos interesses do grupo.
O valor total identificado pela PF inclui diversos tipos de operações, nem todas sob suspeita de irregularidades. Há desde pedidos para depósitos para a compra de imóveis em leilões até o pagamento de contas da faculdade que a família de Vieira mantém no interior de São Paulo. A PF faz a ressalva de que não há certeza de que todos os pagamentos tenham sido concretizados.
A maioria das ordens é destinada a Marcelo, irmão mais novo de Paulo Vieira. Há também pedidos encaminhados a Andreia, sua mulher, e a um dos advogados que atuavam com o grupo. Na conclusão do relatório, obtido pela Folha, a PF afirma que a prática de terceirizar os pagamentos adotada por Vieira é uma "engenhosidade a fim de ocultar o real responsável pelas transações financeiras". Após a operação, Vieira foi preso e exonerado do cargo de diretor de hidrologia da ANA (Agência Nacional de Águas). Seu irmão também teve a prisão decretada.
As ordens de depósitos mostram os investimentos do grupo em imóveis em São Paulo. Em 28 de setembro de 2010, Vieira pede a seu irmão que pague a primeira parcela de dois lotes de imóveis arrematados por ele em um leilão no mês anterior. O valor das parcelas é de R$ 67.350. Há também a autorização para que Marcelo dê lances de até R$ 1,21 milhão para a aquisição de uma casa e quatro apartamentos na região metropolitana de São Paulo, em um leilão em maio deste ano. Não há confirmação de que esses cinco imóveis tenham sido comprados.
Outras transações autorizadas por Vieira foram a compra de um apartamento na zona oeste da capital por R$ 168 mil e um flat por R$ 192 mil. As conversas também mostram que o grupo matinha consigo grandes quantias em espécie. O grupo adotava também a estratégia de dividir as quantias em vários depósitos, segundo a PF, para "dissimular o valor total depositado". (Folha de São Paulo)
A petralhagem no poder prepara um de seus golpes institucionais mais canalhas. O Ministério da Educação Capímunista (MEC) pede urgência à base amestrada do governo para criar um novo monstro burocrático mais perigoso que tiranossaurus-cabides-de-emprego. Trata-se do Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior.
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